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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

As viúvas da seca, de José Walter Pires


CORDEL DE SAIA publica o poema do confrade José Walter Pires. Narra os muitos sofrimentos da seca.

“AS VIÚVAS DA SECA”


São chamadas dessa forma
Mulheres abandonadas
No Nordeste brasileiro
Embora sendo casadas
Mas vivendo sem maridos
E de filhos, carregadas.

Isso ocorre quando a seca
Se alastra pelo sertão
E o Sol queimando tudo
Deixa a terra em exaustão
Com a fome campeando
Matando sem compaixão

Na miséria dos casebres
Padecendo o sofrimento
Sem água para beber
Sem qualquer um alimento
Crianças morrendo à míngua
Em completo desalento

A mãe, coitada, sofrida,
Acomoda as suas crias
Junto ao corpo emagrecido
Com as barrigas vazias
Esperando o Deus dará
Na constância dos seus dias

O pai, sertanejo forte
Inteiramente abatido
Vagueando a imensidão
Com o seu olhar perdido
Preso a um fio de esperança
Dentro do peito escondido

Lembra-se, então, do compadre
Como a sua salvação
Ir embora pra São Paulo
A terra da promissão
Deixando a mulher e filhos
Sob a sua proteção

Dessa forma, decidido,
E o coração palpitante
Chamou a mulher e disse:
— Serei mais um retirante
Vou em busca de outra vida
Numa terra mais distante.

— Não dá mais para ficar
Padecendo nesse amém
Vou, mas voltarei depois
Pra levar vocês também
Se ficar só resta a morte
Nessa terra de ninguém.

Ouvindo aquela notícia
A mulher entristeceu
Com os olhos marejando
Soluçante, respondeu:
— Não há mesmo o que fazer
Do destino que Deus deu!

A procura do Compadre
Dali saiu o marido
Entre todos do lugar
Era o mais bem sucedido
Sempre tirando proveito
De quem fizesse um pedido

— Compadre, venho pedir
Uma ajuda do Senhor
Não tenho do que viver
Só restando a minha dor
Como padrinho do menino
Não me negue esse favor

O compadre ouvindo aquilo
Com seus botões matutou:
— Vem mais uma pra meu prato
Dissimulado, indagou:
— Então diga o que deseja
Porque negar nunca vou!

— Vou embora pra São Paulo
Para poder trabalhar
Vou deixar mulher e filhos
Para o Senhor ajudar
Assim que chover eu volto
Para poder lhe pagar.

— Compadre não se avexe
Pode tratar da partida
Deixe a Cmadre e os meninos
Que darei toda guarida
Lá irei pra consolar
Na hora da despedida

Assim foi o retirante
No primeiro  caminhão
Levando além de esperança
Saudade no coração
Agradecido ao Compadre
Por toda a sua atenção.

No outro dia, de manhã,
O Compadre já estava
Lá na casa da Comadre
Que saudosa se encontrava
Porém, muito confiante,
Pra entrar o convidava

Os dias foram passando
E as visitas mais frequentes
Conversa mais animada
Pra os meninos, presentes
Um cafezinho cheiroso
Os dois tomavam contentes

A bem dizer a Comadre
Não era de jogar fora
Com um pouco mais cuidada
Mudaria sem demora
O Compadre pressentia
Estava chegando a hora

Numa tarde decidido,
Estando com ela só
Ele, então, lhe perguntou
Sem piedade e sem dó:
— “Nóis transa ou bebe café?”
—  “Cumpade,  acabou o pó!

Desse dia para frente
A coisa degringolou
A Comadre mais catita
No sertão desabrochou
O Compadre ali transando,
Até quando ele brochou!

José Walter Pìres
Fevereiro 2010



Um comentário:

  1. Olá Zé Walter,
    Gostei dos seus versos, vi muito esta realidade no Nordeste. Era assim mesmo que acontecia.
    Meu abraço.

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