Seguidores

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Rosa enjeitada - a mulher na poesia e na canção

Cabe um fado relembrar
Uma Rosa enjeitada!
A fadista, ouvi cantar
Rosa tão desventurada
De uma vida a chorar
O poema é baseado no fado "Rosa Enjeitada", com letra de José Galhardo e música de Raul Ferrão.
Rosa enjeitada
1
Na partida houve choro
O porquê não entendia
Pensava que brevemente
Para casa voltaria.
Estava determinado
O lugar pra onde iria
2
Não poderia voltar
E causar decepção
Todo aquele investimento
Doía em seu coração
Dormia sem entender
Questionava a razão
3
Chorava sempre escondida
Só pensava em voltar
Ninguém a compreendia:
“Nada tens a lamentar
Vais ter vida melhor!
Terás como estudar!”
4
Chegando a cidade grande
O susto foi bem maior
Um casal a esperava,
Desconhecido que só!
A rede ficou pra lá
E a vida lhe deu um nó
5
Percebeu a rejeição
Que havia no lugar
- Porque não um bebê?
- Para eu poder criar?
Ouvindo estas palavras
Escondia-se a chorar
6
Sua decepção foi grande.
Ela queria um bebê
Para chamá-la de mãe,
Quando fosse crescer!
Repetia a todo instante:
“- Mas eu queria um nenê”!
7
A menina que sofria
Sentia-se enjeitada
A culpa tomava-lhe a alma
Por não ser a desejada
Sofria quieta e solitária
Sentia-se desajustada
8
Depois de tantos abortos
Não mais pode engravidar
Seu corpo já tão cansado
Não mais podia pegar
A criança desejada
Foi obrigada a adotar
9
Apelou pro afilhado
Com uma prole numerosa
Vou ajudá-lo a criar
Uma criança mimosa
Mas aquela que lhe veio
Já tinha dez anos de rosa
10
Aquela menina alegre
Logo começou a mudar
Desdobrava-se em atenção
Buscando o amor despertar
Mágoas daquele casal
Não conseguiu suplantar
11
A solidão a roia
Sem poder manifestar
Os recados foram claros:
- Não vá aos tios preocupar
Tudo que fazia ali
Parecia não funcionar
12
Dia e noite, noite e dia
Tinha um medo pavoroso
A confusão era tanta
Tudo lhe era assombroso
Conflitos ali vividos
Sem um beijo carinhoso
13
O tempo assim foi passando
E à dor se consumando
A inapetência chegou
Uma anorexia brotando.
Os médicos diziam sempre:
- A criança: tá definhando...
14
Escondia-se nos estudos
Pra nunca decepcionar
Os pais que a haviam perdido
Pra viver em outro lar
Este lar não lhe supria
Queria mesmo voltar...
15
Ficou uma adulta tímida
Sempre com o medo a rondar
Sem saber para onde ia
Com a dor a escalar
Uma angústia tão profunda
Ela teve que ocultar
16
Teve casa e comida
Sem ter realmente um lar.
Pois sua felicidade,
Ficou lá em seu lugar.
Hoje chora relembrando
Seu berço familiar.
*
Rio, outubro de 2011 
Texto e foto : Rosário Pinto

Acesse ainda:
http://rosarioecordel.blogspot.com
http://cantinhodadalinha.blogspot.com

Um comentário:

  1. Minha querida amiga Rosário.
    Linda homenagem ao nosso fado. Como sempre é uma maravilha ler estas palavras cheias de sentido popular, lembrando que o povo é o verdadeiro pendor desta balança social, cada vez mais oprimida por democracias liberalistas, que tornam cada vez as diferenças sociais numa realidade aterradora para as futuras gerações.
    Meu beijo e meu carinho de sempre.
    Victor Gil

    P.S. - Aqui vos deixo o link do fado que homenageiam

    http://youtu.be/IHoeF084JDQ

    ResponderExcluir