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terça-feira, 3 de agosto de 2021

MELHOR IDADE É O CACETE



MELHOR IDADE É O CACETE

1

Seu Rufino adoeceu

Achei por bem visitar

Não era caso de morte

Mas era de preocupar

Seu lamento era constante

Queixava-se a todo instante

Sem parar de resmungar.

2

A sua maior doença

Era seu inconformismo

Foi homem namorador

E agora com reumatismo

Sem poder ir vadiar

Passa o dia a reclamar

Praticando o derrotismo.

3

Eu tentei mudar a prosa

Pra trazer animação

Entretanto seu Rufino

Era só reclamação

Desembestou a falar

Eu tive então que escutar

A sua lamentação.

4

Confesso que tive dó

Estava de fazer pena

Mas com a língua afiada

Repetia a cantilena

E cheio de rabugice

Metia o pau na velhice

Que não chegava serena.

5

Foi o jeito eu me calar

E preparar os ouvidos

Para ouvir o pobre idoso

Com seus ais e seus gemidos

Pois paciência eu tinha

Para ouvir a ladainha

E clamores repetidos.

6

E vocês vão ver agora

O rosário de amargura

Que desfia seu Rufino

Essa pobre criatura

Em cada depoimento

Que lhe sopra o pensamento

Nessa atual conjuntura

 

 

7

A velhice quando chega

Não pede autorização

Massacra o pobre do homem

Maltratando o cidadão

Pra disfarçar a verdade

Chamam de melhor idade

Mas isso é só gozação.

8

Chamar de melhor idade

A chegada da velhice

É querer fazer de besta

Ou usar de gaiatice

Já eu chamo humilhação

Fazer um pobre ancião

Ouvir essa cretinice.  

9
O sujeito inconformado
Quer comer sem ferramenta
Mas só mela a dentadura
Entretanto teima e tenta
Cheira, funga e faz zoada
Depois da quinta brochada
Só sai com cheiro na venta.

10

Quando aparece a desgraça

O velho fica na mão,

Desce pinto, arria o saco

Só sobe mesmo a pressão

E capim novo é besteira

Só dá mesmo é caganeira

Complica a situação.

11

Uma coisa vou dizer

Mesmo sem querer falar

Quando o velho pinto abaixa

Nem vodu pra levantar,

O coitado de tão fraco

Repousa em cima do saco

Só se mexe pra mijar.

12

Meu pai só me apresentava

Cheinho de animação

Este aqui é meu rebento

E afirmava é meu varão

Hoje virei foi piada

A vara que tenho armada

É tão somente um bastão

13

Um dia deste a mulher

Passou pertinho de mim

Vi que o pinto deu sinal

Eu pensei até que enfim

Chamei a mulher pra junto

Ela disse: Esse defunto

Não dá mingau ao Soim.

14

A barriga vai crescendo

A paciência se manda

O passo vai encurtando

Devagar a gente anda

A mulher passa a ter voz

E acaba virando algoz

Pois é ela quem comanda.

15

O cabra quando envelhece

Paga os pecados que tem

Quando peida descuidado

A merda aproveita e vem

Não controla o intestino

E vive esse desatino

Pois da velhice é refém.

16

Quando se sente contente

Na hora que vai sorrir

Vem um peido atrás do outro

Na sequência a escapulir

E pra chatear também

Da garganta logo vem

A vontade de tossir.

17

Quando a dentadura afrouxa

É preciso ter cuidado

O pinto então nem se fala

É bica sem cadeado

Sem carrapeta a torneira

Fica só na pingadeira

E o velho acaba mijado.

18

Meu perfumoso tabaco

Eu não posso mais cheirar

O cheirinho de imburana

Faz o velho espirrar

E nisso o peido enxerido

Chega com seu estampido

Só pro velho envergonhar.

19

Sempre faço um alarido

É quando eu resolvo ler

Os óculos nunca acho

E se você quer saber

Juízo de véi não presta

Quando passo a mão na testa

Vejo o bicho aparecer.

20

A comida Deus me livre

Até parece castigo

Tem quer ser com pouco sal

Sendo carne não mastigo

É leite papa e mingau

Pra variar um curau

Vou acabar num jazigo.

21

Quando vejo uma morena

Passando no requebrado

Eu passo a mão no bigode

Com saudade do passado

E penso: Já fui bom nisso

Mas hoje sou submisso

Pois estou debilitado.

22

Tem dias que amanheço

Que nem o cão me aguenta

Teimando por qualquer coisa

Mas a mulher logo inventa

Um jeito de me acalmar

Já chegou até jogar

Um copo de água benta.

23

O juízo fica pouco

Com toda sinceridade

E o povo besta dizendo

Que isso é melhor idade

Estou sempre resmungando

Pois acho que estão mangando

Da nossa senilidade.

24

Fiquei com dor de cabeça

Com tanta reclamação

Contudo não vou tirar

De Seu Rufino a razão

Mas também posso afirmar

Velho só não vai ficar

Quem antes for pro caixão.

*

Cordel de Dalinha Catunda

Xilo de Maércio Siqueira

 dalinhaac@gmail.com

  

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