14 Novembro 2018
Cordel na cena da Rede Municipal
Por Márcia Pimentel
O
cordel foi reconhecido como patrimônio cultural imaterial brasileiro em
setembro deste ano, mas antes disso, o gênero literário já estava em alta na
Rede Pública de Ensino da cidade do Rio de Janeiro. Desde meados de 2017, um
grupo de 10 professoras vem encenando o espetáculo teatral Mulheres
no Cordel e
cerca de outras 35 têm participado do projeto Versos de Cordel na
Cena Carioca, realizado
pela Gerência de Leitura e Audiovisual (GLA) da Secretaria Municipal de
Educação.
As
oficinas do projeto são ministradas pela atriz e arte-educadora Beth Araújo e
pela cordelista Rosário Pinto, que ensina a estrutura, a métrica e as rimas do
gênero. Escrever uma história de cordel pode ser tarefa fácil para quem, como
ela, cresceu ouvindo suas narrativas. Mas para a maioria das professoras
participantes, que não foram criadas dentro desta tradição oral, conceber
poesias em forma de sextilhas* ou setilhas** (ou ainda outros tipos de estrofes
características) é um grande e laborioso aprendizado.
O
objetivo do projeto, contudo, não é formar virtuoses nesse gênero de literatura
e sim fornecer às professoras ferramentas que estimulem os alunos a conhecer o
cordel, valorizando-o como tradição cultural e possível meio de expressão e
inspiração. Como se trata de poesia com forte viés oral, Beth Araújo capricha
nas oficinas de expressão cênica – da interpretação à confecção dos cenários,
figurinos e adereços –, sem esquecer da perspectiva escrita. Além das técnicas
de composição literária aprendidas com Rosário Pinto, as participantes colocam
a mão na massa para fazer seus folhetos, incluindo capa e gravura
características.
Tanto
as oficinas Versos de Cordel na Cena Carioca como a peça Mulheres
no Cordel são
desdobramentos do projeto Poesia Encena, iniciado em 2013, com o objetivo de
levar aos professores da Rede uma compreensão mais ampla dos diversos processos
poéticos e dar suporte a um outro projeto mais amplo: o Poesia na Escola. Desde
então, o empreendimento vem acontecendo todos os anos sob a batuta da atriz e
arte-educadora Beth Araújo.
Segundo
ela, Poesia
Encena trabalha com uma
metodologia que inclui três etapas: uma pequena parte teórica acerca do
movimento artístico do qual o poema faz parte; uma reflexão de como ele pode
ser adaptado para a escola; e, finalmente, uma prática sobre as análises feitas.
“Buscamos dar ao professor instrumentos para que ele brinque de poesia com os
alunos, usando os elementos do teatro”, explica.
Gerando frutos
Na
edição de 2016, o projeto ganhou desdobramento: a criação da Cia.
de Teatro Poesia Encena,
que produziu seu primeiro espetáculo: Colar de Cora, Colares de Coralina. No
ano seguinte, aconteceu a montagem de Mulheres no Cordel, utilizando recursos multimídia e
narrando a história de autoras do gênero literário, a começar pela primeira
delas: Maria José das Neves Batista Pimentel, que, em 1936, publicou O
Violino do Diabo ou o Valor da Honestidade com o pseudônimo Altino
Alagoano (seu marido).
“O
espetáculo é impactante. Tem projeção de slides, música ao vivo... Muita gente
sai sem acreditar que ele tenha sido feito só por professoras”, conta Clarice
Campos, professora de Língua Portuguesa e da Sala de Leitura da E.M. Eunice
Weaver (7ª CRE). “O processo de criação do espetáculo foi muito interessante. A
Rosário Pinto nos ajudou, entrando em contato com um grupo forte de cordelistas
do Crato e do Juazeiro do Norte, no Ceará. Eles nos enviaram várias informações
fundamentais à criação do texto”, relata Beth Araújo.
Quando
a equipe da SME tomou conhecimento da peça e de sua cuidadosa produção,
convocou Beth para a realização de oficinas específicas, só do gênero
literário, para os professores da Rede. “Isso tudo aconteceu bem antes do
cordel ser proclamado patrimônio imaterial brasileiro”, diz ela, feliz pela
coincidência.
E
assim nasceu o projeto Versos de Cordel na Cena Carioca, cuja culminância
acontece neste mês de novembro, no Ciep Tancredo Neves (2ª CRE), no Catete,
onde os participantes estão apresentando o resultado de suas criações.
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* Sextilha - É a
estrofe mais comum no cordel, formada por seis versos de sete sílabas
poéticas, com o segundo, o quarto e o sexto rimados.
** Setilha ou septilha -
A estrofe possui sete versos: o segundo, o quarto e o sétimo verso rimam entre
si; o quinto e sexto formam uma segunda rima.