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quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

O CASTIGO DA SOGRA MALVADA

O CASTIGO DA SOGRA MALVADA

1

Eu vou contar uma história

Daquelas de antigamente

Que ouvi quando criança

E guardei na minha mente

Foi Tia Isa quem contou

E eu agora aqui estou

Passando a história a frente.

2

Sempre à boquinha da noite

Com cadeiras na calçada

Sentava-se minha tia

No meio da criançada

Que ouvia com atenção

Detalhes da contação

De cada história narrada.

3

Foi assim que me criei

E abraço essa tradição

Um ponto vou aumentando

No transcorrer da oração

Sem esquecer a magia

Das histórias de titia

Nas calçadas do sertão.

4

Pra não quebrar a magia

Desse jeito de contar

Vou imitar minha tia

No modo de iniciar

Descrever como ela fez

Repetindo: ERA UMA VEZ

Para a história começar.

5

Era uma vez uma mãe

Que bem moça enviuvou

Tinha somente um filhinho

Dele muito bem cuidou

Era a razão da sua vida

Para a criança querida

Carinho nunca faltou.

6

Um bom menino ele era

Sempre muito obediente

Auxiliava sua mãe

Não fugia do batente

Viviam em harmonia

Um do outro companhia

O que a deixava contente.

7

O tempo foi se passando

O bom menino cresceu

Seu mundo ficou maior

A mãe logo percebeu

E assim viviam em paz

Pois tornou-se um bom rapaz

O filho que Deus lhe deu.

8

Quando o filho já rapaz

Começou a namorar

Tirou da mãe o sossego

Por ela não aceitar

Mais uma mulher na vida

Da criança tão querida

Do seu menino exemplar.

9

E cada vez que o mancebo

Um namoro iniciava

A velha toda manhosa

Uma doença inventava

Ele muito preocupado

Não saía do seu lado

E sem namorar ficava.

10

Era um moço inteligente

Mas tinha uma mãe sagaz

Uma mulher egoísta

Que de tudo era capaz

Para o filho não perder

De tudo iria fazer

E roubou do moço a paz.

11

Para não aborrecer

Nem a mãe contrariar

Só namorava escondido

Coisa séria nem pensar

Mas quando chega a paixão

Quem fala é o coração

E ninguém pode empatar.

12

Com o filho da viúva

Foi isso que aconteceu

Um dia numa quermesse

Uma jovem conheceu

Passaram a namorar

A mãe quis atrapalhar

Mas resultado não deu.

13

Era moça bem-criada,

Donzela muito bonita

E tinha nome de Santa

Essa meiga senhorita

Foi batizada e crismada

Pelo pai foi registrada

A bela Maria Rita.

14

A viúva a contragosto

A donzela recebia

Porém não se conformava

Com tudo que acontecia

E até fez um juramento

Acabo esse casamento

Não vai demorar dizia.

15

Tratava a futura nora

Com desdém, com insolência

Maria Rita humilhada

Fez promessa e penitência

O casório aconteceu

Maria Rita venceu

Usando de paciência.

16

A velha engoliu o choro

Porém a vingança armava

Na sua cabeça insana

Dia a dia arquitetava

Um plano muito cruel

Com gosto amargo de fel

Com sua astúcia contava

17

O filho mesmo casado

Perto da mãe foi morar

Apesar dos contratempos

Não iria abandonar

A sua mãe tão querida

Mulher que lhe deu a vida

E que não deixou de amar.

18

O seu trabalho era ingrato

Viajava o tempo inteiro

Pois comprava e revendia

Couro pra fazer dinheiro

Deixava a mulher sozinha

Tendo a mãe como vizinha

Sempre ficava cabreiro.

19

Sempre que a sogra podia

Da nora falava mal.

Mas o marido dizia:

- Meu amor é especial!

- Pode ser que sim ou não,

Vamos ver quem tem razão.

Quem está certo afinal.

20

- Minha mulher é honesta

E tem um bom coração.

- Você acredita nisso?

- Porém eu não creio, não!

- E se você não me aprova

- Faça com ela uma prova

Vai ver que tenho razão.

21

- Arquitete uma viagem

- Porém volte do caminho

- De noite você vai ver

- O que sucede em seu ninho.

O rapaz mudou de cor

Seu olhar era de dor

Não queria ser mesquinho.

22

Entretanto resolveu

Fazer o que a mãe queria

Pois viver cheio de dúvidas

Ele não conseguiria

O ciúme lhe encharcava

Mas ao mesmo tempo achava

Que a mulher não merecia.

23

Arrumou a sua viagem

Como em outras vezes fez

E beijou a sua amada

Meio sem jeito, na tez

Pediu pra nossa Senhora

Proteção naquela hora

Pra não se perder de vez.

24

Com o coração partido

Ele deixava seu lar

Sem saber o que seria

Dele quando regressar

Pela fresta da janela

A sua mãe de sentinela

Confiante a vigiar.  

25

A viúva nem pensou

Que Deus é onipotente,

Se o cão, atenta d’um lado,

Deus do outro está presente

Vestiu-se para sair

E seu plano concluir

De maneira inconsequente.

26

Não demorou muito tempo

Um homem apareceu

De terno e usando chapéu

E em sua porta bateu

O moço ficou gelado

Completamente abalado

E a tragédia aconteceu.

27

Correu pra cima do homem

Com uma arma na mão

Descarregou a pistola

Tinha perdido a razão

O homem caiu de bruços

Gritava o moço em soluços

Não aceito traição.

28

Irado arrombou a porta

E a mulher puxou sem tino

Arrastou pelos cabelos

Em completo desatino

Venha ver o seu amante

Que eu matei nesse instante

Você me fez assassino.

29

A mulher sem entender

Apavorada gritava:

- Eu nunca tive um amante!

Mas ele não escutava

E seguia enlouquecido

Pra porta onde o falecido

Ensanguentado estava.

30

Quando chegaram a porta

Ele soltou a consorte

Desvirou o traidor

Que não escapou da morte

De susto ele desmaiou

Porque não acreditou

Na sua falta de sorte.

31

Pois naquela cena atroz

O corpo inerte no chão

De terno e com um chapéu

Lhe causava comoção

Era sua mãe querida

Mulher que lhe deu a vida

Caiu na própria armação

32

A pobre Maria Rita

Resolveu naquela hora

Abandonar o marido

Que o seu perdão implora

Mas ela com os seus ais

Voltou pra casa dos pais

Para sempre foi embora.

*

Cordel de Dalinha Catunda

Ilustração: Roberto Braga

dalinhaac@gmail.com

 

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